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Pedro A. Batista Martins[1]

1. Acaba de ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados projeto de lei que visa possibilitar a ampla utilização da arbitragem no país. Desde 1992 tramitando no Legislativo Federal, o referido Projeto, de autoria do então Senador Marco Maciel, vem tendo ótima acolhida pelos Senadores e Deputados e obtido a aprovação unânime das diversas Comissões que analisaram o seu conteúdo. A proposta de elaboração nasceu de ampla pesquisa formulada junto à Sociedade que resultou na confirmação da necessidade, premente, de se viabilizar o acesso à Justiça através de outra via mais informal e célere do que aquela administrada pelo Poder Judiciário. Após três frustradas tentativas na década de 80, foi uma vez mais redigido novo anteprojeto, em típico arroubo de cidadania, contando essa iniciativa, entretanto, com o maciço apoio da comunidade. O fato de ser essa a quarta tentativa de implementar o procedimento arbitral no Brasil, por si só comprova o anseio da sociedade em ter disponibilizado, de forma eficaz, esse secular sistema de solução pacifica de controvérsias, que tem na informalidade, na celeridade, no sigilo e na especialização dos julgadores – escolhidos pelas próprias partes – seus maiores atrativos.

2. Contudo não bastassem os 3 anos e meio de tramitação do Projeto de autoria do próprio Poder Legislativo, que o bem da verdade, não contém cunho político-partidário algum, esbarra ele em lideranças do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados, que, para surpresa nossa é, com toda certeza, da própria sociedade, recorreu para o Plenário da recente aprovação unânime obtida na Comissão referida de início. Alega o PT, em suma, que o Projeto é inconstitucional por criar verdadeiro órgão judiciário sem previsão constitucional e por impedir o acesso das partes ao Poder Judiciário. Mais ainda, entende o PT que o projeto inova por introduzir a cláusula arbitral que poderá ser altamente perigosa nos contratos de adesão. Contudo, tais argumentações não devem prosperar! Ora, o Projeto não procurou criar órgão paralelo ao estatal, vez que desde os idos de 1916 o nosso Código Civil dispõe sobre o Juízo Arbitral, tendo sido este reafirmado pelos Códigos de Processo Civil de 39 e 73. Mormente,se formos olhar com acuidade as Constituições Brasileiras, descobriremos que todas reservaram espaço especial para tratar desse antiqüíssimo meio de justiça. Já a Constituição do Império, de 1824, admitia a solução de litígios entre nacionais e estrangeiros pela arbitragem. Na verdade, o que o Projeto propõe é a revisão das atuais regras para conferir-lhes uma roupagem mais moderna, em consonância com os tempos atuais, tornando-as mais eficazes.

3. O Projeto, também, não impede o acesso das partes ao Poder Judiciário, pois os contratantes são totalmente livres para aceitar ou não o procedimento arbitral. Não obstante essa liberdade na contratação, o Projeto, cautelosamente, dispõe sobre as hipóteses em que o órgão estatal pode ser chamado a intervir para rever a decisão arbitral (v.g. desvios de conduta dos árbitros, infringência ao princípio do contraditório e da igualdade das partes). Nota-se que a própria Constituição de 1988, em seu preâmbulo, atesta estar comprometida, a nível interno e internacional, com a solução pacífica das controvérsias. Claro esta que a intenção dos constituintes de 1988 foi incentivar os cidadãos à utilização desse meio pacífico de resolver as pendências legais. Tanto é que as Comissões de Constituição e Justiça da Câmara e do Senado julgaram, unanimemente, constitucional o referido Projeto. Como curiosidade, dentre as sugestões encaminhadas à Comissão Redatora do anteprojeto, aquelas recebidas de membros do Poder Judiciário destacaram-se pela propugnação de menor interferência daquele órgão no procedimento arbitral. Quanto à periculosidade da cláusula arbitral nos contratos de adesão, é de se notar que o próprio Projeto teve o cuidado de proteger as partes potencialmente fracas – ao contrário do afirmado pelo PT – ao afastar a aceitação compulsória da arbitragem nos referidos contratos, onde os termos e condições são impostos sem a menor possibilidade de alteração. O fato é que o país, como mencionado pelo ilustre Deputado Federal Celso Russomanno, vive hoje círculo vicioso da justiça que deve ser rompido com urgência. Reformas cosméticas têm sido insuficientes para a superação dos óbices que a cada ano se agravam. No Brasil, temos 8 milhões de processos judiciais em andamento e em relação de 1 juiz para cada 30.000 habitantes, enquanto que na Itália essa proporção é de 1 para 8.000 habitantes e na Alemanha, de 1 para 3.000 habitantes. Como o aumento do número de vagas para magistrados não tem resolvido o impasse, quase intransponível, do acúmulo de medidas judiciais, e o Estado não tem recurso suficiente para atender tamanha solicitação, resta-nos rever o monopólio do Estado na administração da justiça. Novas alternativas de acesso a tão almejada justiça necessitam pronta resposta das autoridades, razão pela qual temos certeza que o PT, sempre atento aos pleitos sociais, não hesitará em reavaliar seu posicionamento frente ao Projeto em questão que traz implícito em seu bojo a administração da justiça pelo povo.

  1. Advogado, Professor e Consultor em Arbitragem.

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