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Pedro A. Batista Martins[1]

1. Há muito propalado, o Plano Diretor do Mercado de Capitais Brasileiro foi, finalmente, transmitido ao público através da edição nos jornais de grande circulação, do elenco de medidas articuladas pela CVM.

2. Em síntese, busca aquela autarquia, com a aprovação e o desenvolvimento do nosso mercado de capitais, consubstanciados em regras de simplificação de procedimentos das companhias abertas e dos agentes do mercado de capitais e, também, em normas de estímulo aos investimentos, internos e externos, e de maior proteção e segurança dos aplicadores.

3. Assim, pretende-se desburocratizar o mercado de capitais com a adoção, entre outras, da dispensa de credenciamento junto à CVM de sociedades corretoras e distribuidoras já devidamente habilitadas pelo Banco Central; de simplificação no processo de fechamento de capital; da liberação da taxa de corretagem cobrada nas operações realizadas em bolsas de valores; na dispensa da intermediação obrigatória de instituições financeiras em lançamentos de ações; na flexibilidade da publicação das demonstrações financeiras das companhias abertas.

4. Dentre as variadas medidas de fomento do mercado que se tenciona implementar, podemos citar: maior transparência das empresas estatais; estímulo à abertura de capital e à capitalização das empresas; aumento de recursos para o mercado via estímulos aos mecanismos de captação de poupança externa; liberdade de ação e maximização da rentabilidade das aplicações dos investidores institucionais; revisão do tratamento tributário dos dividendos; admissão de sócio não patrimonial nas bolsas; facilidade de acesso das empresas de menor porte bolsa de valores.

5. “(…), fato é que em diversos países (…) e vedada qualquer restrição do exercício do direito de voto.”

6. A perspectiva da CVM é de que a maior parte das medidas idealizadas para reordenar o mercado de capitais esteja em vigor no prazo máximo de um ano.

7. De par com os postulados acima indiciados, outros merecem particulares considerações.

8. É a questão, por exemplo, das ações preferenciais sem direito a voto que, hoje, pode alcançar até 2/3 do capital social.

9. O acirrado debate que se instaurou durante o período de elaboração da atual lei do acionariato ainda se mantém aceso.

10. A existência de ações preferenciais sem direito a voto, para seus defensores, viabiliza a abertura de capital e o desenvolvimento daquelas empresas conservadoras e familiares de pequeno e médio porte, já que não há o receio da perda de controle.

11. O percentual de 2/3 seria um dos atrativos ou a contrapartida pela efetiva abertura do capital da companhia.

12. Mas ainda, reforçam suas teses comas estatísticas que comprovam o total absenteísmo dos acionistas nas assembléias gerais.

13. A grande maioria dos acionistas só se preocupa com os ganhos obtidos nas freqüentes aquisições e alienações de suas participações nas bolsas de valores.

14. Já os opositores, por outro lado, sempre se indignaram com o fato de o controle da companhia poder ser assegurado com a participação acionária equivalente, apenas, a 17% do capital social da empresa.

15. Para estes, a existência das ações sem direito a voto cristaliza, por definitivo, a propriedade empresarial, distancia o controlador do universo de suas acionistas e não efetiva a democratização da propriedade, mas sim do capital.

16. Mormente, fato é que em diversos países (v.g. França, Suíça e Bélgica) é vedada qualquer restrição ao exercício do direito de voto. Este é acatado como princípio de ordem pública.

17. Com o Plano Diretor, as emissões de novas ações preferenciais serão restringidas em prol do aumento do número de ações ordinárias, em patente indução à democratização do controle da companhia.

18. Medida de verdadeiro estímulo ao investimento em ações é a proposta da CVM de alteração da lei das S/A, para o fim de preservar o valor real dos rendimentos deste título: torna obrigatória a correção do dividendo a partir do término do exercício social e até o seu efetivo pagamento.

19. Com a alijamento da perda inflacionária, as ações passam a oferecer maior atrativo aos aplicadores por consubstanciar verdadeiro título de renda variável.

20. Com o Plano Diretor, uma vez mais os direitos dos minoritários passam por revisão, só que agora com vistas ao reforço das suas regras de proteção.

21. O acionista deterá, novamente, a opção de se retirar da sociedade nos casos em que a maioria deliberar a incorporação, a fusão ou a cisão da companhia.

22. Muito questionado quando da supressão desse direito dos minoritários, em dezembro de 1989, a sua reintrodução será uma vitória dos profissionais de mercado e, particularmente, da ABAMEC-RJ, que tanto contestou a arbitrariedade praticada e lutou pelo estabelecimento do status quo ante.

23. Resta pendente o restabelecimento do mesmo direito nos casos de deliberação sobre a participação em grupo de sociedades.

24. Por outro lado, conforme o Plano Diretor, a montante a ser pago pela sociedade ao acionista retirante (i.e. aquele que discordas de determinadas deliberações aprovadas pelo controlador) será revisto de modo a assegurar-lhe o valor real de sua participação acionária.

25. O direito constitucional do empregado de participar no lucro da empresa será regulamentado, nos termos do Plano Diretor, de modo a que metade deste benefício seja concedida sob a forma de ações, provavelmente com direito de voto, conforme o manifesto propósito da CVM de indução à emissão e demanda por ações ordinárias.

26. Em contrapartida às propostas de flexibilização e fomento do mercado de capitais, o desestímulo à prática de ilícitos será obtido com maior rigor na aplicação e no aumento das penalidades impostas aos infratores.

27. Nesse sentido, pretende a CVM obter o direito de examinar as contas bancárias daquelas pessoas submetidas a inquéritos administrativos.

28. Matéria das mais sensíveis que assegura poder exacerbado a seu legitimado, deve ser examinada com cautela, até porque a inviolabilidade da vida privada é garantia constitucional fundamental do cidadão.

29. Por fim, deve ser aplaudida a sugestão de constituição de câmara de arbitragem para solução das questões do mercado financeiro e de capitais.

30. Muito utilizada nos países desenvolvidos, a arbitragem propicia exame e decisão dos conflitos com maior rapidez e por árbitros com larga experiência na matéria (o que não acontece no Poder Judiciário) além de desobstruir a emperrada máquina da justiça estatal.

31. Sem dúvida são medidas de impacto, formuladas em boa fé, e que servirão de estímulo e fortalecimento do nosso tão combalido mercado de capitais, cuja elaboração, no entanto, deve ser precedida de ampla discussão pelas partes interessadas.

  1. Advogado, Professor e Consultor em Arbitragem.

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