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Pedro A. Batista Martins[1]

“Fala-se muito no conservadorismo dos juristas, mas a melhor maneira de conservar consiste em renovar e reformar as instituições, adaptando-as ao novo contexto no qual vivemos, para que elas possam exercer adequadamente as suas funções”. (Arnoldo Wald – A Estabilidade do Direito e o Custo Brasil).

9. A Justiça do Século XXI – Do Virtual à Realidade

1. Vivemos hoje a chamada democratização social, causa de vários fenômenos econômicos e políticos e – por que não! – também de efeitos legais, como a emblemática mitigação da rígida conceituação da soberania.

2. Em poucas palavras, essa democratização social significa maior participação dos indivíduos e das associações de interesse na formação de decisões políticas, administrativas e legais. Trata-se de verdadeira democratização cidadã.

3. Esse fenômeno se contrapõe, diretamente, ao Estado Absoluto do século XIX e, de certo modo, ao Estado Intervencionista vivenciado por nós, brasileiros, nas últimas décadas, e reflete a atuação cívica dos indivíduos em vários campos de interesse social.

4. Com a débacle do sistema estatal, apresenta-se um vácuo de liderança onde, forçosamente, evolui a participação de grupos cidadãos no desfecho de causas comuns, reforçada pela retomada da valorização do ser humano.

5. Como conseqüência, o Estado deixa de ser o único e cômodo veículo de manifestação social para tornar-se agente com funções de supervisão dos atores e das atuações da coletividade.

6. Esse é o cenário que já se delineia no campo social e que, com maior integração dos indivíduos e organização dos grupos representativos, logrará nobres êxitos.

7. Direcionando o foco para o terreno dos princípios e regras de convivência e de conduta humana, percebemos que esse novo século nasce engrandecido pelo surgimento da terceira geração do direito, cuja concretização, apesar de ainda gradual, trará inequívoca melhoria na evolução das relações comunitárias.

8. Assegurados, historicamente, os direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais, surge o moderno direito social, cujo objetivo final é o desenvolvimento e o ser humano seu valor supremo[2].

9. Supremo, mas não absoluto, pois não é com egocentrismo que se implementará essa nova geração do direito. Deve o indivíduo ser encarado sob a ótica da fraternidade, pois o que se impõe a esse mundo de múltiplas convivências é a solidariedade.

10. Abraçado a essa terceira geração, surge ampliado o direito constitucional de acesso à justiça; contudo, sua concretização há de ser plena, efetiva e com a participação dos indivíduos na sua administração.

11. Tal alargamento do escopo desse legado natural encontra eco na contemporânea conceituação do due process of law, não mais analisado, unicamente, sob o ponto-de-vista processual; agora, é regra constitucional de salvaguarda do direito material, que visa a tutela dos direitos e garantias fundamentais do ser humano[3].

12. Sem dúvida, os modernos direitos sociais renegam o Estado anestesiado, cômodo e inócuo. A inatividade da máquina estatal é rechaçada, pois o justo desejo de uma efetiva e ampla prestação positiva colide frontalmente com a inércia e a ineficiência hoje realçadas[4].

13. Daí reclamarem os indivíduos participação nas decisões de caráter estatal.

14. Está aí o embricamento do cenário contemporâneo da democratização social com a cunhada terceira geração do direito.

15. As exigências dos indivíduos como usuários dos serviços estatais redundam no direito à prestação, no direito à participação, mas, para o alcance desse desiderato político-legal, há que se desenvolver e praticar o princípio maior da solidariedade.

16. Daí minha visão de que a justiça do século XXI estará ligada aos avanços dos meios alternativos de solução de conflitos (ADR), cujos mais conhecidos são a mediação, a conciliação e a arbitragem.

17. Isso porque, quando falamos em solidariedade, encontramo-la nas ADR, onde o consenso e a boa-fé são de sua essência.

18. Se a ansiedade social é aplacada pela exigência e obtenção de rápida resposta à prestação da tutela pretendida, eis novamente as ADR a instrumentalizar esse justo pleito, evitando a ruptura definitiva daqueles envolvidos na disputa.

19. O recuo do Estado intervencionista, ao convergir com o ímpeto participativo dos indivíduos em esferas decisórias – antes exclusividade estatal – veio, naturalmente, desaguar na cabeceira das ADR, onde a administração da justiça é levada a efeito pelo povo.

20. Não é sem razão que a crise universal da justiça é, contemporaneamente, combatida pelo movimento da terceira onda, via implementação e ampliação das ADR[5].

21. Entretanto, para que possamos lograr sucesso no campo das ADR, é preciso flexibilizar o arcaico conceito de jurisdição para dele extrairmos elementos justos, atuais e tão nobres quanto aquele que ainda hoje prevalece.

22. Ao lado do conteúdo estritamente jurídico da jurisdição, devemos iluminar seus escopos social e político, intrínsecos ao princípio e sobremaneira eficazes a esse século que se inicia[6].

23. Concisa e objetivamente falando, como salienta o Prof. Cândido Dinamarco, é imperativo acabarmos com o fetichismo da jurisdição!

24. De outro lado, também, mister aprendermos a conviver com a liberdade. De nenhum efeito prático o ressurgimento de um cenário livre à atuação do particular, pelo refluxo do papel estatal, se os indivíduos relutam em adentrá-lo por receio do novo, pela ausência do Estado-Providência e medo de serem levados a responder, isoladamente, pelas obrigações contraídas sob a égide da autonomia da vontade, sem paternalismos e benesses.

25. É preciso reaprender a conviver com a liberdade, após intermitentes anos de ditaduras e intervenções estatais.

26. Sem dúvida o Brasil, nesse século XXI, superará largamente a fase de engatinhamento na utilização dos meios alternativos de solução de conflitos e avançará, sobremaneira, na melhoria dos serviços de administração da justiça. Se não por manifestação oriunda do seio de sua própria administração, ao menos por força dos anseios da coletividade.

27. Ademais, com sua fértil cultura e a miscigenação do seu povo, trará ao mundo relevante criatividade nesse campo moderno de apaziguação das disputas de interesse.

28. Até porque é imperativa a mudança na rota do acesso à justiça, ainda hoje, – samba de uma nota só – com a monopolização pelo Estado de serviço essencial de interesse público.

29. Senão, vejamos!

30. Enquanto na Alemanha existem 3.000 habitantes por juiz e na Itália 8.000 hab./juiz, no Brasil temos a média de 25.000 hab./juiz. Note-se que o ideal, conforme pesquisa internacional, gravita em torno de 800 hab./juiz.

31. Na Alemanha, a Suprema Corte costuma julgar em torno de 6.000 processos por ano. Já, nos EUA, a mais alta Corte aprecia e julga, por ano, ao redor de 130 processos. No Brasil, o Supremo Tribunal, no ano de 1996, proferiu 32.000 decisões, aproximadamente, 3.000 por Ministro[7].

32. Registre-se que a média do Superior Tribunal de Justiça, mutatis mutandis, é a mesma do STF.

33. No segmento laboral, o Japão apresenta, historicamente, 1.000 reclamações por ano, enquanto a Inglaterra 66.000/ano. Incrivelmente, no Brasil, a média gira em torno de 6.000 reclamações trabalhistas por dia, com um custo ao Erário Público equivalente a R$ 720,00 (aproximadamente US$ 400) por processo que percorra todas as vias (crucis) judiciais.

34. Frente a esses dados, que, longe de serem detrimentosos ao Poder Judiciário, o enaltecem dada a espantosa produtividade de seus membros, põe-se a indagação do direcionamento de maiores recursos e agigantamento desse Poder fundamental ao Estado.

35. Infelizmente, temos de nos render à realidade. Tal pretensão, apesar de justa, é inviável! O Estado não suporta aumento de orçamento do Judiciário, pois somente a Justiça do Trabalho recebeu, em 1996, duas vezes o orçamento destinado ao Ministério da Agricultura e quatro vezes o direcionado ao Ministério das Minas e Energia.

36. Ressalte-se, ainda, que de 1989 a 1997 as despesas de pessoal do Judiciário quintuplicaram. Em 1998, a folha salarial cresceu 51%. Entre 1990 e 1996, a participação do Judiciário nos gastos de custeio e investimento passou de 2,9% para 7,8% do total dos três poderes, o que resulta em aumento médio de 27% ao ano[8].

37. É hora de aceitarmos e convivermos com os ventos da modernidade.

38. A par da utilização das ADR, devemos também lograr resultados no aprimoramento das regras do direito adjetivo.

39. Esse é mero instrumento de atingimento da tutela jurisdicional. Tratemo-lo como meio de concretização do direito material e não como ciência absoluta[9].

40. Minimizemos os ritos e deixemos florir a essência do contido no artigo 244 do Código de Processo Civil, eleito a mais bela regra do direito processual civil mundial[10].

41. É hora de reeducarmos os operadores do direito[11].

42. Os advogados não podem mais servir de representantes autômatos do litígio. Na qualidade de peça fundamental na administração da justiça, são devedores de prestação de serviços jurídicos cada vez mais qualificados. Estamos frente à advocacia reparadora do século XXI, onde o contencioso é a última instância.

43. Imperiosa a manutenção da relação comercial e, para isso, imprescindível a boa-fé no aconselhamento jurídico. Há que se acabar com a máxima “o advogado forma-se, deforma-se e conforma-se com o contencioso” ressaltada pelo Desembargador Claudio Vianna de Lima.

44. Nesse sentido, cabem aplausos à iniciativa do Ministério da Educação ao estabelecer como referência ao perfil delineado para o graduando oriundo do Exame Nacional do Curso de Direito de 1998 “capacidade de desenvolver formas extrajudiciais de prevenção e solução de conflitos individuais e coletivos”[12].

45. O mesmo se diga do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que incluiu a arbitragem como matéria do concurso de ingresso na magistratura.

46. De outro modo, a criação de Câmaras de Mediação e Arbitragem vinculadas a instituições de renome, o apoio financeiro às ADR de entidades nacionais aliadas ao Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, demonstram confiança no projeto brasileiro de desenvolvimento dos meios alternativos, iniciado ainda no começo da década de 90, graças à determinação insuperável do Dr. Petrônio Muniz e ao apoio insubstituível do então Senador Marco Maciel.

47. Temos plena esperança de que a criatividade brasileira entrelaçada a sua gene apaziguadora dará impulso salutar e qualitativo à justiça do Século XXI, com a implementação dos vários meios de solução dos conflitos de interesse.

10. Decisão de Vanguarda do Tribunal de Justiça de São Paulo

48. Finalizando o estudo que evoluímos ao longo dos últimos três artigos acerca da postura do Judiciário frente ao novo modelo legal de arbitragem instituído pela Lei Marco Maciel, não poderíamos deixar de registrar a decisão proferida pela Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo nos autos do Agravo de Instrumento n° 124.217.4/0, em 16.9.1999.

49. Esse julgado unânime retrata a melhor interpretação quanto à aplicação dos efeitos jurídicos da cláusula compromissória, pois assimila e dá curso, com tranqüilidade e proficiência, ao que vínhamos defendendo desde a edição da Lei n° 9.307/96.

50. A ação judicial de instituição forçada da arbitragem, elencada no artigo 7° da lei de arbitragem, pode ser evitada se o conteúdo da convenção for suficientemente abrangente a permitir sua instituição diretamente pela Câmara de Arbitragem ou, até mesmo, pelo tribunal arbitral ad hoc.

51. Passemos, pois, à referida decisão sem embargo de alguns comentários pontuais quanto a outras questões abordadas pelo Tribunal no mesmo decisum.

EMENTA

AÇÃO – CONDIÇÕES – Instituição de juízo arbitral – Alegação de falta de legítimo interesse processual – Acolhimento – Existência de compromisso e procedimento arbitral validamente instalado perante órgão arbitral institucional livremente eleito pelas partes – Desnecessidade de intervenção judicial – Lei n° 9.307/96 – Preliminar acolhida.

ARBITRAGEM – Lei 9.307/96 – Inconstitucionalidade por violação do Artigo 5°, inciso XXXV, da Constituição Federal – Afastamento – Preceito constitucional que não impede a renúncia das partes a submeter a questão litigiosa à apreciação judicial, a qual não excluída, porém, a manifestar-se sobre a validade do ato – Direito patrimonial disponível – Obediência ao pacta sunt servanda – Transação entre as partes que atribui à decisão do laudo arbitral efeitos de ato jurídico perfeito – Recurso provido.

ARBITRAGEM – Cláusula compromissória – Execução – Existência de acordo prévio em que as partes estabelecem a forma de instituir a arbitragem, adotando as regras de órgão arbitral institucional, ou de entidade especializada – Hipótese de cláusula compromissória cheia – Submissão às normas do órgão, ou entidade, livremente escolhido pelas partes – Desnecessidade de intervenção judicial a firmar o conteúdo do compromisso arbitral – Recurso provido.

Trechos do voto condutor da lavra do Desembargador Relator Rodrigues de Carvalho:

Contudo, a Lei de Arbitragem n° 9.307/96, vinda em boa hora – que, ao contrário do que muitos pensam, prestigia o Poder Judiciário, pois, sob certo aspecto, traz de volta a sua apreciação aquelas causas que dele haviam emigrado -, flexibilizou regras e ampliou situações, que tornam a convenção de arbitragem operosa e agilitada. Por isso mesmo, merece prestigiada naquilo em que não fere o sistema pátrio, a Constituição Federal. A bem dizer, há quem entenda de manifesta inconstitucionalidade a Lei n° 9.307/96, pois que retiraria do Poder Judiciário a apreciação da lide (art. 5°, XXXV, da Constituição Federal). Mas, o preceito Constitucional impede que se exclua, porém não que as partes, livremente, renunciem, a permitir apreciação extrajudicial à questão litigiosa comum. Havendo transação entre as partes, pois disponível o direito em questão, deve obediência ao pacta sund servanda. Nisso não há violência à Constituição. Isso não fere o due process of law.

E, se alguns artigos da lei valem-se de equívoca terminologia, empregando termos técnicos, atecnicamente, com sentidos diversos (v.g. sentença e coisa julgada), há de se entender como ato jurídico perfeito e seus efeitos, o direito adquirido que daí emana, há de se interpretá-los dando-lhes adequação jurídica correta, como o faria o legislador racional. Nele buscando a essência do legislador racional. E como tais, podem ser submetidos ao crivo do Judiciário, como a própria lei prevê. A transação havida entre as partes atribui à decisão do laudo arbitral não os efeitos da coisa julgada, mas sim os do ato jurídico perfeito, tornando estável o direito por ele declarado (direito adquirido). Verifica-se, sem dúvida, nítida influência da Convenção sobre o Reconhecimento e Execução das Sentenças Arbitrais Estrangeiras, Nova York, 1958, art. III, mas que há de se adaptar ao sistema constitucional pátrio, conforme acima interpretado (ver Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional, art. 4°, aprovada pelo Decreto-Legislativo n° 90, de 1995, que, ao empregar a expressão “terão força de sentença judicial definitiva”, permite a interpretação alcançada neste Acórdão)

(…)

A cláusula compromissória, hoje, permite que as partes, em acordo prévio, estabeleçam a forma de instituir a arbitragem, podendo se reportar às regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada, internacional ou não, quando se obrigam a sujeitar-se às normas por ele ditadas.

Podem, igualmente, estabelecer na própria cláusula ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem (art. 5°). Caso não haja acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, por via postal ou por outro meio adequado de comunicação, deverá a parte interessada a valer-se da cláusula compromissória, para dar início à arbitragem, intimar a outra para firmar o compromisso arbitral. Não comparecendo a parte convocada, ou, comparecendo, recusar-se a firmar o compromisso arbitral, restará à outra parte, em razão da resistência quanto `a instituição da arbitragem, propor, em juízo, ação à celebração do compromisso arbitral. Tem-se, assim, dois tipos de cláusula compromissória. Uma, que não prevê as regras sobre a forma de instituição da arbitragem. Outra, que a prevê. Estas, denominadas completas, ou cheias; aquelas, vazias. O problema que surge, agora, é saber se, para execução específica, ambas exigem a via judicial. Duas correntes de pensamento se formaram. A primeira entende que, havendo cláusula compromissória, resistindo uma das partes à instituição da arbitragem, a via jurisdicional se impõe. A segunda, entendemos que somente às cláusulas compromissórias vazias é que se faz mister a intervenção judicial. Isso porque, a cláusula compromissória cheia, para que se institua a arbitragem, permite adotar-se as regras de órgão arbitral institucional, ou entidade especializada, regras essas que serão obedecidas a processar-se e instituir o juiz arbitral. E, na cláusula compromissória cheia permite-se, também, estabelecer algumas das regras próprias do compromisso arbitral, senão todas.

52. O primeiro passo advém da manifestação livre da vontade dos convenentes que, ao se (e para se) concretizar, se desloca, se transmuta no exercício de vontade (autorização) estatal.

53. Os poderes do árbitro não lhe são conferidos por direito atávico das partes, pois não os têm disponíveis em seu patrimônio jurídico. Sua fonte é pública e surge da norma legal que legitima esse direito.

54. A liberdade das partes encontra limites na autonomia que se extrai da lei. Em conseqüência, os poderes e a liberdade do árbitro no exercício de munus publicum condicionam-se aos ditames da convenção e da lei, sendo esta o escopo máximo a ampará-los.

55. Trata-se da publicização do processo e não da processualização da arbitragem, como querem ou pensam os privatistas.

56. A jurisdicionalização do instituto, flagrante inclinação do legislador, alinha-se à tendência de publicização da justiça como forma de melhor administrá-la e desobstaculizar seu acesso.

57. Ao aceitar os termos e condições da sua nomeação expostos na convenção, o árbitro investe-se de poderes para, com imparcialidade e independência, atuar em nome do Estado.

58. Nessa atividade é o árbitro juiz de fato e de direito, com a função de aplicar o direito. Nessa atividade é o árbitro juiz de fato e de direito, com a função de aplicar o direito na plenitude de seus poderes jurisdicionais.

59. Seja o procedimento de caráter legal ou convencional, enquanto julgador, tem este o poder, mas, antes, o dever de apreciar os fatos e o direito trazidos pelas partes. Essa fase de conhecimento, de ponderação e valoração que antecede o iudicium é semelhante àquela percorrida pelo juiz togado. As atividades dos dois não se confundem, antes, espelham-se.

60. Com a indicação do árbitro querem os interessados a solução da disputa. Transferem a terceiro, por força convencional, mas com supedâneo legal, a tarefa de dizer o direito e, assim, pacificar o conflito. Também aqui não difere a função do juízo estatal daquela desenvolvida pelo julgador no juízo arbitral. Ambos exercem o iudicium de forma obrigatória e vinculante[13].

61. O mesmo ocorre com o conteúdo dos poderes assegurados ao árbitro. Nesse particular, sem dúvida, com limitações em relação ao dos juízes togados, porquanto despojados de força coercitiva e executória.

62. Mas isso não é suficiente para desqualificar a jurisdição arbitral, pois, dentre outros argumentos, nos processos judiciais declaratórios onde esses dois componentes jurisdicionais não se manifestam, as decisões não perdem sua força, tampouco sua imutabilidade.

63. No dizer de Joel Dias Figueira Junior, “Magistrados e árbitros, são todos os dois juízes; apenas um é um juiz público, nomeado pelo Estado, enquanto o outro um juiz privado, escolhido pelas partes. Idênticas as suas funções, sendo que a de árbitro decorre de investidura contratual. Justiça arbitral e justiça estatal distinguem-se apenas pelos órgãos que as exercem”[14].

64. Ou ainda, na afirmativa de Humberto Theodoro Júnior, “Fácil é concluir que a opção do legislador foi pela atribuição do caráter publicista ao juízo arbitral, tornando-o um completo equivalente jurisdicional, por escolha das partes”[15].

65. Por certo, o poder jurisdicional da arbitragem não decorre da vontade jurídica das partes, mas, sim, do seu amálgama com a prerrogativa contida no ordenamento jurídico. Esta, sim, a legítima.

66. E, nesse ponto específico, a Lei Marco Maciel não deixa dúvidas quanto ao seu desiderato jurídico. Afastou a necessidade da homologação da decisão arbitral nacional e acabou com a chamada dupla homologação da sentença estrangeira que se deseja internalizar.

67. Como forma clara de demonstrar a inclinação pela tese publicista da arbitragem, o legislador subtraiu o termo laudo, passando a generalizar terminologia consentânea à realidade: sentença arbitral.

68. Mais ainda, revestiu a sentença arbitral dos mesmos efeitos da decisão estatal (declaratória; constitutiva), inclusive o condenatório.

69. Por fim, alterou o Código de Processo Civil para elencar a sentença arbitral no rol dos títulos executivos judiciais. Parece-nos que esses dados, por si só, refutam o estampado no voto do eminente julgador, contrário à natureza publicista da arbitragem.

11. A Via Residual do Artigo 7° da Lei de Arbitragem

70. Há muito vimos sustentando o caráter subsidiário do comando contido no artigo 7° da Lei Marco Maciel[16].

71. Essa convicção em nada se esmaeceu com o entendimento esposado pelo Min. Pertence em seu voto de ataque à constitucionalidade do referido dispositivo.

72. Ao contrário, gerou apenas, e tão só, surpresa, assim como perplexidade.

73. Sem entrarmos no mérito dessa questão, até porque o faremos, concisamente, no item 14.2 deste artigo, é nosso intuito traçar algumas linhas de suporte à decisão da 5ª Câmara de Direito Privado do TJSP, de extrema importância para o ágil desenrolar da arbitragem no país. Deveras preciso, acurado e de extrema sensibilidade o voto proferido pelo Desembargador Rodrigues de Carvalho.

74. Como bem demonstrou, duas correntes se impõem a respeito do tema. Uma que leva necessariamente a instituição da arbitragem à via judicial, no caso de renitência da parte. A outra, mais branda e em linha com os termos da lei brasileira, possibilita sua instituição pela própria câmara de arbitragem ou pelo próprio juízo arbitral ad hoc. Para tal, ficam as partes a depender da extensão do contido na cláusula compromissória e do que dispuser o Regulamento da Câmara.

75. Destarte, a doutrina e, agora, o Judiciário têm admitido variações de conteúdo objetivo da cláusula compromissória. Podem ser de cunho branco (ou vazio), auto-regulado ou pleno (cheio).

76. Diga-se, desde logo, que o critério objetivo quanto ao conteúdo da cláusula não afeta sua eficácia. Seja ela plena, branca ou auto-regulada, seus efeitos hão de ser prestigiados. Em qualquer das hipóteses a arbitragem há de ser instituída.

77. Isso porque os três critérios recebem o beneplácito legal. Seja quanto a sua validade, seja quanto a sua eficácia.

78. Dispõe o artigo 5° da Lei n. 9.307/96, verbis: “Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral institucional ou entidade especializada, a arbitragem será instituída e processada de acordo com tais regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláusula, ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem”.

79. Essa norma assegura ao intérprete a visão da cláusula compromissória sob duas dimensões distintas, mas complementares. A dimensão objetiva, que visualiza a extensão do seu conteúdo, e a dimensão teleológica, que autoriza vislumbrar-se como se processará a instituição da arbitragem, em caso de futuro conflito.

80. A dimensão objetiva é condição da análise dos efeitos da dimensão teleológica. Sendo de conteúdo pleno ou cheio, a instituição da arbitragem deverá seguir o que fixar o regulamento da câmara de arbitragem. De outro modo, tratando-se de convenção auto-regulada, o processamento para a instituição da arbitragem submeter-se-á ao acordado na própria convenção.

81. A dimensão teleológica deve refletir a exata medida da dimensão objetiva. Em outras palavras, as variações de conteúdo objetivo da cláusula compromissória determinarão a dimensão teleológica aplicável ao fim pretendido.

82. Havendo ajuste sobre a forma de se instituir a arbitragem, esta se procederá nos termos disciplinados. É o que se extrai, naturalmente, do direito contido no artigo 5° da lei de arbitragem.

83. Nem mais, nem menos. É esse o caráter da dimensão teleológica lançado na norma.

84. Do mesmo modo como ocorre nos casos em que a convenção prefixa os termos para a instituição da arbitragem, também naqueles em que os convenentes não se manifestam a esse respeito – cláusula compromissória branca ou vazia -, a lei oferece o caminho da solução.

85. É o que dispõe o artigo 6°, verbis: “Não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte interessada manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, convocando-a para, em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral. Parágrafo único. Não comparecendo a parte convocada ou, comparecendo, recusar-se a firmar o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a demanda de que trata o art. 7° desta Lei, perante o órgão do Poder Judiciário a que, originariamente, tocaria o julgamento da causa”.

86. Essa norma se dirige à modalidade clássica de cláusula compromissória vazia ou branca. Seu conteúdo restringe-se a remeter ao rito arbitral a solução de futura controvérsia. Nada disciplina quanto à forma de instituir e se iniciar a arbitragem. De tão seca a sua redação, não resta às partes outro caminho (inexistindo consenso) senão a via judicial para o cumprimento forçado de obrigação de fazer. Obrigação essa, diga-se a bem da técnica jurídica, de instituir a arbitragem, e não de firmar compromisso como insistem alguns. O compromisso é ato secundário que não se reveste da significância que alguns açodados ainda lhe emprestam.

87. Daí por que o artigo 6°, e somente este, remete a parte ao artigo 7° da lei, o qual disciplina a forma judicial de se instituir a arbitragem. Essa a dimensão teleológica haurida do artigo 6° da lei de arbitragem. Havendo resistência de uma das partes, por força de cláusula compromissória branca, adota-se a execução específica prevista no artigo 7° da Lei Marco Maciel.

88. Repita-se: na ausência de cláusula compromissória plena ou auto-regulada, e somente nestas faltas, a instituição da arbitragem efetuar-se-á mediante cooperação do Poder Judiciário.

89. Daí por que temos afirmado o caráter supletivo ou residual do artigo 7° da Lei n. 9.307/96, aliás em linha com os princípios da arbitragem, pois dá celeridade ao processo e restringe a interferência do juízo estatal[17].

90. Assinale-se que essa interpretação, adotada também pela 5ª Câmara de Direito Privado do TJSP, é consentânea com o entendimento do Min. Nelson Jobim expresso em seu recentíssimo voto vista sobre a constitucionalidade da Lei n. 9.307/96 (AgRg em Sentença Estrangeira 5.206-7, Reino da Espanha), nos termos a seguir transcritos:

A ação do art. 7° nada tem com as demais cláusulas compromissórias, ou seja, aquelas que se remetem às regras de órgão ou entidade ou aquelas que possuem pacto sobre a instituição da arbitragem.

Estes tipos de cláusulas compromissórias dispensam a lavratura de um novo pacto, tudo porque já existe “acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem”, como diz a lei (art. 6°).

Os dados relativos à instituição da arbitragem, nas demais cláusulas, estão – todos – definidos ou definíveis por normas prévias:

a) as regras do órgão; ou

b) da entidade especializada; ou

c) aquelas fixadas pelo árbitro; ou

d) as regras ajustadas na própria cláusula.

Na verdade, nestes casos, a superveniência do litígio opera como condição para a eficácia dos dispositivos relativos à instituição da arbitragem. O litígio é uma condição suspensiva.

Exatamente por isso que a ação do art. 7° é exclusiva da “cláusula compromissória em branco”.

É esta a única que requer uma decisão sobre a instituição da arbitragem, tudo porque não há “acordo prévio sobre a forma de …” instituí-la (art. 6°).

Nas demais, de uma forma ou de outra, há previsão e normas prévias para a instituição da arbitragem[18].

12. A Arbitragem perante o Supremo Tribunal Federal

91. Desde a edição da Lei Marco Maciel, o Supremo Tribunal Federal vem enfrentando duas questões pontuais no tocante à arbitragem.

92. A primeira, a desnecessidade de se obter a homologação na justiça de origem, como pressuposto de admissibilidade do pedido de reconhecimento e execução de sentença estrangeira.

93. A segunda, o já famoso e delongado incidente de inconstitucionalidade.

12.1 Repúdio à Dupla Homologação

94. Até a vigência da Lei n. 9.307/96, o STF vinha exigindo a prévia homologação da decisão arbitral pelo tribunal judicial do local da arbitragem, como condição sine qua non à internalização do decisum na jurisdição brasileira.

95. Isso porque as primeiras legislações brasileiras a tratar do assunto – Decreto n. 6982, de 1878 (art. 13); Lei n. 221, de 1894 (§ 4, art. 12) e Decreto n. 3082 (parte V, art. 14) – facultavam a homologação no Brasil de sentenças arbitrais estrangeiras que tivessem sido previamente chanceladas pelo tribunal judicial do lugar da prolação da decisão.

96. A essa vertente do direito positivo acrescia o fato de que o Código de Processo Civil sempre exigiu a homologação da decisão arbitral doméstica, sob pena de produzir efeitos meramente morais[19].

97. Esse dado, destarte, reforçava a tese da dupla homologação (i.e. no tribunal judicial estrangeiro e no STF) como forma de se imprimirem ao laudo estrangeiro condições de eficácia idênticas às da decisão arbitral nacional.

98 Não obstante, já na vigência do ordenamento arbitral anterior à Lei Marco Maciel, os estudiosos do tema eram acordes em admitir o desprezo pela homologação do laudo no país de origem, ao menos quando a legislação do correspondente Estado não o exigisse ou previsse expressamente.

99. Essa tendência doutrinária não foi de todo acolhida pelo STF, a não ser timidamente, no voto da lavra do Min. Thompson Flores, proferido no julgamento da SE n. 1982 – EUA, a saber:

3. Certo poderia ser examinada a hipótese de dispensar a homologação da justiça americana, a que foi proferida pelo Juízo arbitral.

Era mister, todavia, ao menos, se fizesse prova do direito em questão, nos termos do art. 212 do Código de Processo Civil, o que não se fez, quiçá porque suas normas foram apenas afloradas, nelas se não fundamentando o pedido.

100. Frente a esse débil conservadorismo, não restou ao legislador nacional outra opção senão romper expressamente com a chamada “dupla homologação” da decisão arbitral estrangeira, para fins de exequatur no Brasil.

101. Essa indesejável tradição sofreu a ruptura merecida com a edição da Lei Marco Maciel, nos termos da regra exposta em seu artigo 35[20]

102. Por outro lado, certo de que muitas vezes o intérprete tradicional se utiliza de vias oblíquas para ater-se à praxe, o legislador conferiu o mesmo tratamento à sentença arbitral interna. Dita o artigo 18 da lei de arbitragem que a sentença proferida pelo árbitro não fica sujeita a homologação pelo Poder Judiciário.

103. O dilema, pois, está superado. Aliás, soberanamente superado com as recentes decisões unânimes do Pleno do Supremo Tribunal Federal[21].

12.2 O Incidente de Inconstitucionalidade

104. A segunda questão enfrentada pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, ainda sub-judice, advém do conhecido incidente de inconstitucionalidade suscitado no julgamento do Agravo Regimental em Sentença Estrangeira n. 5206-7, Reino da Espanha.

105. Após mais de quatro anos em debate, oito ministros já ofertaram seus votos, permanecendo, no momento, seis votos (Ministros Nélson Jobim, Ilmar Galvão, Ellen Gracie, Celso de Mello, Marco Aurélio Mello) favoráveis à ampla constitucionalidade da Lei n. 9307/96, contra dois votos (Ministros Sepúlveda Pertence e Sydney Sanchez) pela inconstitucionalidade do § único do art. 6° e dos arts. 7°, 41 e 42.

106. Dada a ausência de julgamento definitivo, a seguir trazemos à colação concisa manifestação a respeito do tema, redigida pelo signatário do presente e pela ilustre arbitralista Selma M. Ferreira Lemes.

12.2.1 Intróito

107. A democratização das massas que se faz presente no final do século XX penetra, sobremaneira, no campo processual civil, como força aliada da última onda renovatória no acesso à justiça. Concretiza o anseio cidadão de efetiva participação nas atividades administrativas, políticas e legais do Estado.

108. A distância entre representados e representantes e a constante inatividade da máquina estatal têm levado os indivíduos a movimentos proativos de defesa de seus interesses naturais.

109. E o Estado, em certa medida, tem correspondido a essa realidade. Os institutos da ação popular e da ação civil pública são exemplos de instrumentos jurídicos postos à disposição dos cidadãos e associações para cooperarem com o Estado na tarefa de realização da justiça. O mesmo ocorre com as atividades jurisdicionais do Júri e dos antigos juízes classistas. Por interesses políticos e desejo do cidadão, o Estado delega poderes a particulares para decidirem, com autoridade, as lides que se instauram. Consubstanciam-se em caminhos legais de democratização processual, fruto este da estagnação estatal no plano do acesso à justiça e da conscientização da fragilidade do Estado frente a sua pretensa onipotência.

110. Nesse diapasão, a experiência de outros povos aponta a arbitragem como outro bom exemplo do convívio harmônico e frutífero Estado/cidadão na realização do desiderato supremo de justiça. No interesse e sob a supervisão do Estado, e por sua expressa autorização, particulares livremente escolhidos pelos interessados dizem o direito aplicável ao caso concreto.

111. Essa publicização da justiça está em linha com os modernos direitos sociais, que renegam o Estado inócuo e clamam por uma efetiva participação dos cidadãos nas questões básicas de convivência social. O novo milênio está frente à solidariedade, ao consenso e à boa-fé, atributos presentes nos meios alternativos de solução de controvérsias[22].

12.2.2 O Art. 5°, Inciso XXXV, da Constituição Federal

112. A inserção desse dispositivo na Carta de 1946 objetivou, exclusivamente, espantar experiência ditatorial que precedeu a Constituinte, regime esse que permitia a submissão de certos casos ao crivo definitivo de tribunais administrativos.

113. Leis eram promulgadas com o objetivo de impedir os cidadãos de buscar as vias judiciais para dirimir o conflito ou mesmo para rever as decisões proferidas por comissões paralegais.

114. Daí a menção que o inciso XXXV do art. 5° da Constituição Federal atual faz à lei, pois, como bem esclarece Brandão Cavalcante, essa referência expressa tem seu fundamento basilar na tendência de certa legislação do regime constitucional de 1937, que excluía da apreciação judicial as providências nela consagradas; o interesse público servia de fundamento àquelas medidas.

115. Corroborando esse entendimento, salienta Pontes de Mirandaque o objetivo da norma constitucional em apreço foi o de educar as próprias autoridades governamentais, já que é para elas que se direciona o princípio – “dirige-se ela aos legisladores: os legisladores ordinários nenhuma regra jurídica podem editar que permita preclusão em processo administrativo, ou em inquérito parlamentar, de modo que se exclua a cognição pelo Poder Judiciário”[23].

116. Vê-se que o bem jurídico protegido é a garantia de acesso. Não pode o Legislativo ou o Executivo – destinatários da norma – vedar, por lei, o direito de qualquer pessoa acionar o Poder Judiciário para a tutela de seu direito.

117. Entretanto, não há no preceito constitucional, seja explícita ou implicitamente, nenhuma proibição que possa levar o intérprete a concluir pela impossibilidade de qualquer pessoa resolver suas controvérsias fora da arena judicial.

118. O cidadão tem autoridade para transacionar o seu direito, ou até mesmo a ele renunciar.

119. Esta questão, por sinal, se encontra superada na doutrina e jurisprudência comparada.

120. No campo jurisprudencial, assinalam Craig, Park e Paulsson que, na França, a Suprema Corte entendeu que a cláusula compromissória constitui renúncia válida ao princípio de direito natural[24].

121. Também na Espanha, ainda ao tempo da legislação anterior, em que se fazia sentir a dicotomia conceitual entre cláusula compromissória e compromisso, ambos os institutos produziam o efeito de excluir a jurisdição de juízes e tribunais estatais, conforme Sentença do Tribunal Supremo de 15.09.86[25].

122. Na Itália, informa-nos Nelson Nery Junior que o tema da constitucionalidade foi superado pela Sentença n° 2, em decisão da Corte Constitucional de 12.02.63[26].

123. Por seu turno, o Pleno do Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de manifestar-se pela constitucionalidade da arbitragem em causa contra a Fazenda Pública[27].

12.2.3 O Art. 7° da Lei n. 9.307/96

124. O art. 7° surge na Lei n. 9.307/96 como mecanismo capaz de superar um dos grandes obstáculos ao implemento da arbitragem no Brasil, qual seja, a ineficácia da cláusula compromissória.

125. Com a edição da Lei Marco Maciel, a cláusula compromissória passa a produzir eficácia positiva: havendo resistência da parte em submeter a questão ao Juízo Arbitral, cabe ao credor acionar a justiça estatal, via referido artigo 7°, para dela obter o resultado pretendido.

126. De cunho eminentemente processual – e não constitucional -, a execução específica contida no dispositivo legal é viés adequado e amplamente utilizado para suprir a vontade da parte inadimplente e prover ao titular do direito violado o resultado prático desejado.

127. Registre-se não configurar a cláusula compromissória em obrigação futura de se comprometer, pois comprometida está quando os contratantes concordam com esta disposição no âmbito da autonomia da manifestação da vontade.

128. A obrigação pactuada é a de instituir a arbitragem no momento do surgimento do conflito. Daí por que o que se busca do Judiciário não é a substituição da vontade do devedor pela autoridade do juiz, mas sim a concretização por este do direito do credor de ter instituída a arbitragem.

129. Nada há de ilegal nessa assertiva, pois em linha com as reformas processuais recentemente implantadas, que pregam a efetividade do processo e, assim, a busca do resultado prático almejado pelo credor, nos exatos termos do contrato[28].

130. O processo é instrumento à disposição do interessado para fazer valer o acordo firmado. Seu período teleológico reverteu o axioma de que toda obrigação de fazer descumprida (salvo exceções) redunda em perdas e danos[29].

131. Hoje inadimplido o pacto arbitral, pode o credor utilizar-se da execução específica judicial para concretização do negócio jurídico ajustado: a instituição da arbitragem.

132. Isso porque nosso direito processual acolheu a chamada norma de encerramento, que propicia a adoção de medidas nominadas ou inominadas, de forma a ter concretizado o efetivo direito do credor.

133. Conforme salienta Marcelo Lima Guerra, tem crescido o reconhecimento e a proteção dos chamados “novos direitos”, isto é, situações não enquadráveis no clássico catálogo de direitos subjetivos, onde se encaixa a obrigação de fazer. Nesse sentido sustenta o referido autor que é à luz da exigência de prestação efetiva de tutela executiva, como conteúdo de um direito fundamental, que se pode dimensionar a importância da regra contida no parágrafo 5° do art. 461 do CPC[30].

134. Irrelevante também o desconhecimento do preciso objeto da controvérsia, quando da assinatura da cláusula compromissória, pois que tal ignorância é relativa.

135. Essa aparente insegurança jurídica não enseja, por si só, o desnaturamento dos efeitos jurídicos da cláusula compromissória. Isso porque a disputa, por ter origem em contrato, tem seu escopo confiavelmente confinado nos limites da relação jurídica ajustada.

136. O que importa ao direito é a determinabilidade da questão conflituosa. As nuances havidas entre o determinado e o determinável já não importam mais ao intérprete.

137. Os instrumentos contratuais, por sua própria natureza, trazem em si, freqüentemente, comandos de cunho determinável a necessitar de convalidação futura e, nem por isso, traduzem-se em meras projeções de direito desprovidas de eficácia.

138. A inexeqüibilidade dessa específica obrigação de fazer – instituir a arbitragem – afronta o nosso sistema legal, mormente após a radical mudança conceitual das normas processuais, na direção da efetividade e da busca da concretização do negócio jurídico contratado.

139. O que o direito rechaça é a cláusula compromissória aberta – sem fronteiras -, onde as partes convencionam submeter à arbitragem litígios futuros desvinculados de qualquer relação jurídica preexistente.

140. Por outro lado, o direito de ação não resta afetado por qualquer das normas da lei de arbitragem, posto que esse direito não se afigura um dever, já que passível de renúncia por ato de vontade, seja por ação expressa, tácita ou mesmo por total passividade de seu titular.

141. Trata-se de direito adjetivo afeto a direito patrimonial disponível. Como assevera Carlos Eduardo Caputo Bastos, “na consideração de que a ação é o instrumento de realização do direito material, a renúncia deste, em sendo possível (direito patrimonial disponível), há de oportunizar, por via de conseqüência, a renúncia daquela, até porque, no plano de correspectividade entre direito e ação, a renúncia ao direito de ação estará balizada na mesma proporção da medida e possibilidade de renúncia da pretensão material de que o sujeito é titular”[31].

142. Não bastasse, podemos aludir que a aparência de renúncia do direito de ação se traduz, na verdade, em um deslocamento da jurisdição onde ele opera. Esse direito passa a ser exercido em sede arbitral, por autorização expressa do Estado, onde, regra geral, também deságuam os clássicos conceitos de jurisdição, ação e processo.

143. Neste sentido acentua J. E. Carreira Alvim: “as deficiências da Justiça Estatal, notoriamente ligadas à sua deficiente estrutura operacional, podem ser equacionadas com a transposição dos conflitos do campo da jurisdição estatal para o da jurisdição arbitral; ao mesmo tempo, o processo, enquanto instrumento, será o adequado à controvérsia a ser dirimida; e a ação será a ajustada ao litígio a ser julgado”[32].

12.2.4 O Direito Comparado

144. Em breve incursão na legislação e doutrina comparada, verificamos que a lei nacional, no que tange à intervenção do Judiciário como forma de cooperação na instituição da arbitragem, se encontra em linha com as legislações mais modernas sobre arbitragem, editadas nos últimos vinte anos.

145. Em Portugal, a Lei no 31 de 29.08.86 (artigo 12) outorga aos tribunais a possibilidade de delimitar o litígio e indicar árbitros, na ausência de acordo das partes[33].

146. Na Espanha, a lei de arbitragem autoriza a intervenção judicial caso as partes não acordem quanto à nomeação do árbitro[34].

147. Nos Estados Unidos, após a Segunda Grande Guerra, a Suprema Corte assentou jurisprudência quanto à eficácia e executoriedade da cláusula compromissória[35].

148. Igualmente, na Itália, a nomeação do árbitro poderá ser efetivada via execução compulsória, perante a autoridade judiciária, nos termos dos artigos 4° e 5° da Lei n. 5 de janeiro de 1994[36].

149. Também no direito alemão é permitida a intervenção do Judiciário para decidir sobre a nomeação do árbitro nos termos do art. 1035 do CPC (com a modificação introduzida pela Lei de 22.12.97)[37].

150. Na Holanda, que desde 1986 possui uma das mais completas leis sobre arbitragem, o art. 1027 do Código de Processo Civil estabelece que as partes são livres para determinar como os árbitros serão indicados, competindo ao presidente da Corte Distrital nomeá-los na ausência de acordo das partes[38].

151. Na Inglaterra, também o Judiciário pode ser chamado a intervir na nomeação do árbitro, conforme previsto no art. 18 do Arbitration Act, de 1996, em vigor a partir de janeiro de 1997.

152. Na Bélgica, por meio da Lei de 19 de maio de 1998, que alterou os dispositivos relativos à arbitragem no denominado Código Judiciário, o art. 1684 outorga competência para o Presidente do Tribunal de Primeira Instância indicar árbitro quando uma das partes deixar de fazê-lo[39].

153. Perfilhando a mesma senda, encontramos ainda na legislação unitária dos Cantões Suíços que regula as arbitragens domésticas (Concordat sur l’arbitrage de 27.08.69) a competência do Tribunal Superior da jurisdição civil ordinária do Cantão em que se encontra a sede da arbitragem para nomear árbitros, quando as partes não o fazem, ou haja divergências. Para as arbitragens internacionais com sede na Suíça, a Lei de 1987, no art. 179, estipula tratamento idêntico e manda aplicar, quando for o caso, o previsto na legislação cantonal[40].

154. Recentemente temos a lei grega, de 18 de outubro de 1999, que prevê a interferência do Judiciário para indicar árbitros (art. 11)[41], e a lei sueca, de 04 de março de 1999, cujo art. 12 outorga competência para o Tribunal de Primeira Instância nomear árbitros[42].

13. A Prática Arbitral no Brasil

155. Sabedores do desprezo brasileiro pelo levantamento estatístico, a análise geral da prática do instituto desde o advento da Lei n. 9.307, em novembro de 1996, naturalmente, fica à mercê de uma certa dose de imprecisão ou, até mesmo, de especulação.

156. Não obstante, alguns dados concretos podem ajudar na avaliação do fluxo de arbitragem e do seu desenvolvimento ao longo dos últimos quatro anos.

157. Sem dúvida não foram poucas as instituições (Associações Comerciais; Federações de Indústrias; Confederações; Câmaras de Comércio)que constituíram seus Centros ou Câmaras de Arbitragem.

158. As já existentes ao tempo da edição da lei revisaram seus procedimentos e fortaleceram suas estruturas internas, aparelhando-se, assim, para melhor enfrentar o curso dos processos arbitrais.

159. Surgiu o Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem – CONIMA, desenhado para ditar diretrizes, zelar pela harmonia institucional dos órgãos arbitrais e cooperar na busca do desenvolvimento da mediação e da arbitragem no Brasil. A ele estão ligadas dezenas das mais importantes entidades arbitrais do Brasil.

160. Dentre vários trabalhos promovidos pelo CONIMA destacam-se os Modelos de Código de Ética para Árbitros e Mediadores e de Regulamentos de Arbitragem (inclusive, Expedita) e Mediação.

161. Marcantes, ademais, as centenas de artigos, conferências e livros disponibilizados aos interessados, em conseqüência da nova roupagem jurídica dada à arbitragem pela Lei Marco Maciel.

162. De fato, o arsenal literário sobre o tema, as preocupações macro do CONIMA e o surgimento das Câmaras de Arbitragem encontram sentido nos registros de recente pesquisa feita junto às instituições brasileiras de arbitragem, divulgada pelo CONIMA, onde constam realizadas 885 arbitragens de natureza comercial e 13.463 arbitragens de índole trabalhista, de 1999 a março de 2001.

163. Em sede de mediação, detectaram-se, no mesmo período, 7.164 no campo comercial, 2.100 de origem trabalhista e 638 de natureza diversa.

164. Conquanto tais registros sirvam, tão-somente, como uma fotografia preliminar da evolução dos institutos da mediação e da arbitragem, carecendo ainda de reanálise mais profunda e precisa por parte dos pesquisadores e das instituições arbitrais, por certo demonstram que há vida se desenvolvendo fora da arena judiciária e que a empatia dos cidadãos por essas vias de acesso à justiça transformará em realidade prática a lei de arbitragem brasileira.

  1. Advogado, Professor e Consultor em Arbitragem.
  2. O fortalecimento da soberania popular é que se põe, na presente quadra histórica, como importante. Soberano é o cidadão e não o Estado. Atente-se a que a cidadania, por sua vez, é cada vez mais supranacional. O direito de participar do poder político não mais se restringe ao território de um Estado, estendendo-se principalmente porque ele se exerce para assegurar a dignidade da pessoa humana – princípio essencial de qualquer ordenamento – e, onde esta tiver sido atingida, há que haver um cidadão disposto a colaborar com o ameaçado ou lesado em seu direito para a pronta defesa, independente da nacionalidade… A matéria dos direitos humanos, que dominam o cenário jurídico nas últimas décadas, vem comprovar que a soberania estatal não se sobrepõe ao direito que resguarde o homem em sua condição universal. O cuidado daquele tema constitui, irretorquivelmente, uma superação da soberania estatal absoluta e intangível ao questionamento do resto do mundo – . (Carmem Lucia Antunes Rocha, – Constituição, Soberania e Mercosul – , RDA n° 213, p. 57).
  3. O Pleno, na ADIn n° 1.158-8, em decisão do Min. Celso Mello, consagrou essa visão moderna do devido processo legal: – (…)Todos sabemos que a cláusula do devido processo legal – objeto de expressa proclamação pelo art. 5°, LIV, da Constituição – deve ser entendida, na abrangência de sua noção conceitual, não só no aspecto meramente formal, que impõe restrições de caráter ritual à atuação do Poder Público, mas, sobretudo, em sua dimensão material, que atua como decisivo obstáculo à edição de atos legislativos de conteúdo arbitrário ou irrazoável. A essência do substantive due process of law reside na necessidade de proteger os direitos e as liberdades das pessoas contra qualquer modalidade de legislação que se revele opressiva ou, como no caso, destituída do necessário coeficiente de razoabilidade – .
  4. A Emenda Constitucional n° 19, de 4.6.98, impõe uma justiça eficiente no interesse dos jurisdicionados (- Art. 3°… [Art. 37] A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência… – ), que, infelizmente, não vem redundando em ganhos práticos para a sociedade.
  5. Vale conferir o estudo do Prof. Mauro Cappelletti, objeto do Relatório de abertura do Simpósio Jurídico W. G. Hart sobre a Justiça Civil e suas alternativas, realizado em julho 1992, in Revista Forense, Vol. 326, p. 121 e segs.
  6. Essa finalística da jurisdição é abraçada por Ada Pellegrini Grinover.
  7. Segundo fontes jornalísticas de 27 de outubro de 1999 (Revista Veja, p. 35), os 11 ministros do STF bateram mais um recorde em 1999: julgaram cerca de 53.000 processos. Isso significa mais de 4.800 processos por ministro, que, em princípio, terão lido 78.500 páginas por semana, cada um, o equivalente a 46 Bíblias. Não obstante, a remessa diária chegou a 200 novos processos.
  8. Estudo de Armando Castelar Pinheiro, economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Social – BNDES (O Globo, coluna política Panorama Econômico, jornalista Miriam Leitão, 20.2.99).
  9. Para ilustração sarcástica, alguns trechos da obra – Tempo e Processo – , de José Rogério Cruz e Tucci, RT, 1998, p. 15: – Cappelletti chegou a comparar a presteza da justiça italiana ao trabalho de um relógio quebrado, que deve ser “batido e sacudido” (“hit and shaken“) para continuar em movimento… Desde os tempos de Justiniano – anota Calamandrei – “quando se concebiam os meios processuais para impedir que os litígios se tornassem poene immortales, o processo era imaginado como um organismo vivo, que nasce, cresce e, por fim, se extingue por morte natural com o julgado” [diria eu, por morte natural do demandante].Verifica-se, efetivamente, que um número considerável de processos à espera do julgamento assemelha-se à expectativa, para alguns crentes, da chegada do Messias…
  10. Segundo consagrou o IX Congresso Mundial de Direito Processual, realizado em Portugal.
  11. Como já manifestado em cenário pretérito, “…[é] do Direito que hão de vir as soluções. Esta é, pois, a hora do jurista, que não pode ficar apegado a instituições que fenecem, colocando-se de costas para o futuro, por amor a uma ordem que não é mais ordem. Cumpre-lhe, com seu pensamento crítico, e sua fé na justiça, retomar a liderança que lhe cabe no processo, tentar a abertura de caminhos novos, trazer sua contribuição ao mundo que nasce, participar da grande aventura de torná-lo mais humano e solidário”. Texto do Prof. Alfredo Lamy Filho ressaltando, à época, a premente necessidade de modificação da lei das S.A.
  12. Portaria n° 163, de 27.2.98, publicada no D.O.U. de 2.3.98, Seção 1, págs. 2 e 3. (14) Como função da jurisdição, pode o árbitro declarar a (in)constitucionalidade de lei. Essa certeza advém da extensão legal e conceitual dos poderes do árbitro e, também, sob o ângulo prático, da necessidade de se bloquearem alegações de inconstitucionalidade formuladas de má-fé com o intuito de prejudicar o trâmite da arbitragem.
  13. Na arbitragem, com maior grau de vinculação, pois que aplicável à cláusula sem recurso.
  14. Arbitragem, Jurisdição e Execução, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2ª ed., 1999.
  15. A Arbitragem como Meio de Solução de Controvérsias, Revista Forense, Vol. 353, pág. 112/3.
  16. Cf. Aspectos Fundamentais … op. cit. pág. 215. Art. 7° Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo, a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim.
  17. Aspectos Fundamentais … op. cit. pág. 215.
  18. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, Ano 4, n° 11, janeiro-março 2001, pág. 366.
  19. Cf. Pedro A. Batista Martins, Aspectos Jurídicos da Arbitragem Comercial no Brasil, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 1990, pág. 86.
  20. “Para ser reconhecida ou executada no Brasil, a sentença arbitral estrangeira está sujeita, unicamente, à homologação do Supremo Federal”.
  21. Sentença Estrangeira Contestada n. 5828-7, Reino da Noruega, 6.12.2000, Relator Min. Ilmar Galvão, D.J. 23.2.2001 e Sentença Estrangeira Contestada n. 5847-1, Reino da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, 1.12.1999, Rel. Min. Maurício Correa, D.J. 17.12.1999.
  22. Kazuo Watanabe com proficiência adverte que “não se pode pensar apenas no sistema de resolução dos conflitos através da adjudicação da solução da autoridade estatal. Conflitos há, mormente aqueles que envolvem pessoas em contato permanente, como nas relações jurídicas continuativas (v.g., relações de vizinhança, de família, de locação), para os quais a mediação e a conciliação são adequadas, pois não somente solucionam os conflitos como têm a virtude de pacificar os conflitantes. E há outros em que o arbitramento é perfeitamente cabível, com a possibilidade de amplos resultados positivos”. Acesso à Justiça na Sociedade Moderna, in: Participação e Processo, Ada Pellegrini Grinover et alii, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1988, p. 132.
  23. Comentários à Constituição de 1967, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1971, tomo V, p. 109.
  24. International Chamber of Commercial Arbitration, Paris, ICC – Publishing S.A., 1990, p. 491.
  25. Cf. Lorca Navarrete, Derecho de Arbitraje Interno y Internacional, Madrid, Tecnos, 1989, p. 54. Na mesma linha, em 1989 o Tribunal Supremo em recurso de Cassação, analisando a lei de arbitragem à luz do art. 24.1 da Constituição (similar ao art. 5°, inciso XXXV, da Constituição Brasileira)asseverou que “1. O ordenamento jurídico espanhol concede aos particulares a possibilidade de optar para a solução de seus problemas sócio-jurídicos entre o procedimento ou via jurisdicional ou extrajudicial (artigos 1809 e seguintes e especialmente a estes efeitos o artigo 1814 do Código Civil). 2. Fazendo uso dessa faculdade, e do disposto no artigo 1255 do citado corpo legal, os aqui contendentes pactuaram valer-se do procedimento extrajudicial – arbitragem – para resolver as questões que do cumprimento do contrato entre eles celebrados poderiam surgir. 3. O artigo 24.1 C.E., que se estima infringido pelos recorrentes, se limita a assinalar o direito que todo cidadão tem em obter a tutela efetiva dos juízes e tribunais no exercício de seus direitos e interesses legítimos, mas não impede a igualmente faculdade constitucional de optar para mencionada tutela o procedimento extrajudicial – arbitragem neste caso – como aqui foi feito”. (tradução livre). Revista de La Corte Española de Arbitraje, vol.VI, 1990, p. 157/61.
  26. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1991, p. 351.
  27. RTJ 52/168 e RTJ 68/382. └ guisa de ilustração, notamos que a Recomendação n. R (86) 12, adotada pelo Comitê de Ministros do Conselho da Europa, estimula a utilização da arbitragem como alternativa eficaz de acesso à justiça. (Bulletin d’Information sur les Activités juridiques au sein du Conseil de L’Europe et dans les Etas Membres, n. 23 (jan./87).
  28. Acentua Cândido Rangel Dinamarco que “… É tempo de repúdio ao conceitualismo e ao conformismo. O processo civil de hoje é necessariamente um processo civil de resultados, porque sem bons resultados, e efetivos, o sistema processual não se legitima”. Fundamentos do Processo Civil Moderno, São Paulo, Malheiros, 3 ed., 2000, Tomo I, p. 318.
  29. A propósito dos novos paradigmas do processo civil moderno que fundamentaram as reformas legislativas no último quartel do século passado, observa o prof. Cândido Rangel Dinamarco que as ondas renovatórias da legislação processual necessitam estar acompanhadas de uma mudança de mentalidade dos operadores do direito, lembrando que fora Mauro Cappelletti que advertiu para a necessidade de se adaptarem os espíritos, sob pena de nada valerem as reformas. Mais adiante, comentando o princípio da tutela específica e que a obrigação só deve ser convertida em perdas e danos em último caso, adverte que “… A conversão da obrigação em perdas e danos, que em si é portadora de uma meia-justiça, só se admite quando impossível a realização do resultado pretendido ou se o preferir o próprio credor (art. 461, § 1°). À facilidade com que no passado se convertiam em pecúnia as obrigações específicas vem reagindo a doutrina do passado e do presente, residindo no novo art. 461 uma eficiente resposta a esses anseios. Atente-se também à recomendação de que “na medida do que for praticamente possível, o processo deve propiciar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ele tem o direito de obter (Chiovenda)”, op. cit. p. 305, 317/8.
  30. Inovações na Execução Direta das Obrigações de Fazer e Não Fazer, in: Processo de Execução e Assuntos Afins, Coord. Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo, Revista dos Tribunais, p. 298/9.
  31. A Questão Constitucional da Arbitragem, Correio Braziliense, maio/99.
  32. Tratado Geral da Arbitragem Interno, Belo Horizonte, Mandamentos, 2000, p. 83.
  33. Antonio Marques dos Santos, Notas sobre a Nova Lei Portuguesa à Arbitragem Voluntária. Lei n. 31/86, de 29 de agosto, Revista de La Corte Española de Arbitraje, vol. IV, 1987, p. 15/50.
  34. Lorca Navarrete, op. cit. p. 55.
  35. E. Zelek, Commercial and Labor Arbitration in Central America, coordenado por Alejandro Garro, Transational Juris, Nova Iorque, 1990, p. 233.
  36. Arnoldo Wald, Da Constitucionalidade da Lei n. 9307/96, Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, RT, ano 3, n. 7, janeiro/março, 2000, p. 329.
  37. Cf. Miguel Gómez Jene, La Nueva Regulación del Arbitraje en Alemania, Revista de la Corte Española de Arbitraje, vol. XIV, 1998, p. 369.
  38. J. E. Bitter, Comentário. Ley Holandesa de Arbitraje de 1986, Revista de La Corte Española de Arbitraje, vol. V, 1988-89, p. 422.
  39.  Revue de L’Arbitrage, n. 3, 1999, p. 695.
  40. Cf. Pierre Lalive, F. Poudret & C. Reymond, Le Droit de L’Arbitrage Interne et International en Suisse, Payout Lausanne, 1989, p. 40 e 179.
  41. Revue de L’Arbitrage, n. 2, 2000, p. 329/30.
  42. Revue de L’Arbitrage, n. 1, 2000, p. 146. 

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