Pedro A. Batista Martins cobra mecanismo que espelhe reais mutações patrimoniais
1. As demonstrações financeiras de uma empresa são, por excelência, o instrumento de conhecimento de seu patrimônio, “a estrela guia” dos titulares e administradores da sociedade, assim como dos credores, dos investidores, do Fisco e do Estado, que, numa visão macroeconômica, dela se utiliza para fins de ajuste da estatística nacional.
2. Assim sendo, é de suma importância que as mutações patrimoniais nelas registradas exprimam as reais alterações dos seus valores pois, caso contrário, os acionistas terão informações desatualizadas do valor de seu investimento, o produto do capital investido será apurado inadequadamente, o imposto sobre a renda será distorcido conforme traduza ganho ou perda meramente nominal e os próprios órgãos da administração serão, naturalmente, induzidos em erro.
3. Desse modo e objetivando atenuar os efeitos maléficos do crescente surto inflacionário que se refletem nas demonstrações Financeiras das sociedades, a legislação tributária, e, a partir de 1976, a lei societária, vêm buscando mecanismos, tanto quanto possíveis, eficazes de combate às distorções por este causadas.
Patrimônio deve exprimir a sua mudança de valor
1. Nesse sentido, a Lei das S.A. (6.404, de 15/12/76) introduziu no universo societário, equilibradamente, dispositivo de determinação dos efeitos das inflação sobre o valor dos elementos do patrimônio e os resultados do exercício das companhias (artigo 185).
2. Tal preceito, que impõe sejam considerados os efeitos da perdas do poder aquisitivo da moeda nacional, visa, dentre outras cautelas, manter, em moeda atual, o valor do capital social lançado em contra do patrimônio líquido da sociedade.
3. Nesse particular, a salvaguarda do artigo 185 combinado com o artigo 167, do mesmo diploma legal, foi estabelecida pelos legisladores a partir da assimilação do conceito jurídico de que o capital social tem por finalidade assegurar no patrimônio da Companhia o fundo nele expresso, para que os credores não venham a ser burlados com o esvaziamento do ativo societário pela distribuição, aos acionistas, do resultado de suas participações além do “Índice” admitido.
4. Assim, no âmbito jurídico, o capital social é “cifra de rentenção” que, em proteção aos credores, bloqueia a devolução, aos sócios, das parcelas do capital por aqueles investido, ou, como bem esclarece Joaquim Garrigues ( in Curso de Derecho Mercantil – Tomo I – p.439 – 7ª ed. Madrid – 1977) :
“…El capital social es, por el contrario (do Patrimonio), solamente una cifra permanente de la contabilidad, que no necesita corresponder a un equivalente patrimonial efectivo. Indica esa cifra el patrimonio que debe existir, no el que efectivamente existe. Esta cifra es una de las menciones esenciales de la escritura de constitución… La determinación del capital social en la escritura significa la declaración de que los socios han aportado a han oferecido aportar a la sociedad a lo menos un conjunto de bienes (patrinomio) equivalente a esa cifra y que la sociedad asume la obligación de conservar en interés de los acreedores un patrimonio igual, por lo menos, a la cuantia del capital. La razón de esta obligación de la sociedad reside en la nota de limitación de responsabilidad que es esencial a la sociedad por acciones. Los acreedores no tienen acceso directo al patrimonio dos accionistas…”
5. Ajustado a essa função, foi possível harmonizar o conflito de vontade existentes entre os acionistas ( l.e. receber os frutos das participações) e os credores (i.e. proteção adequada dos seus créditos) e, com isso, possibilitar um mínimo de garantia às obrigações societárias face a limitação de responsabilidade dos sócios.
Ajustes Devem Ser Definidos de Forma Judiciosa
1. Com esse espírito, a nossa Lei das S.A. consagrou uma série de normas de proteção ao capital social (v.g. prévia avaliação dos bens incorporados – art. 86, I; mínimo de realização do capital – art. 80, II; proibição de emissão de ação abaixo do valor nominal – art 13; proibição da sociedade negociar suas próprias ações – art. 30, reserva legal – art 193;oposição dos credores na redução do capital social – art. 174) inclusive a que impõe a capitalização de reserva de capital resultante da correção monetária do capital social realizado (art. 167).
2. No entanto, após ter sido revogado o instituto da correção monetária (Lei nº 7730, de 31/1/89), este retorna ao nosso sistema legal societário através da Medida Provisória nº 38 de 3/2/89 – art 27 – (adotada pela Lei nº 7738, de 9/3/89) que, inopinadamente, deixa, in albis, os critérios de indexação do valor dos elementos do patrimônio e os resultados do exercício da pessoas jurídicas, e posterga, sine die, sua fixação, que passa a depender das edição de decreto.
3. Clientes das distorções que a ausência de tal instituto acarretaria ao universo societário, é mister, no momento de sua reintrodução, que os mecanismos e critérios de sua determinação a serem estabelecidos pelo decreto, sejam apreciados e elaborados de forma judiciosa, sob pena de retroagirmos ao tempo em que, resultados meramente nominais eram largamente distribuídos aos investidores – em prejuízo dos credores – no errôneo entendimento de que tais lucros constituíam, para a empresa, rendimentos ou ganhos reais.
4. No momento em que os efeitos da perda do poder aquisitivo da moeda deixa de ser fidedignamente refletido nas demonstrações financeiras, pelo menos parte do resultado de várias empresas agrega um ganho fictício (meramente nominal) que é distribuído aos sócios em fraude ao capital social ocasionando, em conseqüência, efetiva diminuição da garantia dos credores.
5. É de salientar, neste particular, que a ausência de critérios que espelhem honestamente o reflexo, nas demonstrações financeiras das empresas, da perda do poder aquisitivo da moeda, pode ocasionar ainda, em desproveito dos credores, a descapitalização e, quiçá, a própria falência de algumas sociedades.
Empresas Podem Falir com Falta de Critérios
1. Assim, é forçoso concluir que, em virtude do que dispõe o artigo 27, in fine, das Lei nº 7738/89, às autoridades competentes incumbe, o mais breve possível, elaborar, adequadamente, critérios legítimos e confiáveis de ajuste do valor dos elementos do patrimônio e os resultados do exercício, em razão da modificação no poder de compra da moeda nacional, mormente quando se sabe que o nosso Código Penal (art. 177, VI) e assim também o Anteprojeto de Lei que dispõe sobre Instituições Financeiras, Define Crimes Financeiros e dá outras providências (art. 243), atentos a aspectos em questão, tipificam e cominam penalidade de 1 a 4 anos de reclusão, além de multa, àqueles que distribuírem lucros ou dividendos fictícios.
Indefinição Sobre o Novo Indexador Gera Insegurança
1. As empresas capitalizadas vão pagar Imposto de Renda este ano sobre um lucro inflacionário, caso o Governo deixe para julho a fixação de um novo índice de correção dos balanços. Quem faz a afirmação é Mazart de Figueiredo Galvão, controller da Companhia Souza Cruz indústria e Comércio, que pode ficar nessa situação.
2. Se o novo índice sair em julho mas for retroativo, tudo bem – ressalva a controller da multinacional -, mas, de qualquer maneira, os resultados trimestrais vão ser enganosos e distorcidos, razão pela qual ele sustenta a necessidade urgente de que o indexador saia antes da primeira publicação de resultados do trimestre, que será no fim de abril.
3. O ex-presidente da CVM, Arnoldo Wald, diz que o órgão tem uma minuta de estudos pronta e em fase de discussão e que nos próximos dias deve ter decisões a esse respeito, embora admita que a CVM tem poderes limitados na matéria. Ele acredita que o índice adotado venha a ser o IPC mas, segundo o superintendente de Normas Contábeis, Hugo Rocha Braga, o decreto que está sendo elaborado pela CVM diz que o ministro da Fazenda baixará portarias mensalmente, especificando os índices.
4. Pode ser que nas discussões se chegue a um consenso neste sentido – avalia Rocha Braga – , mas o certo é que a CVM pretende sugerir a institucionalização dos critérios de correção monetária integral para as companhias abertas, conforme a instrução 64, que lançou em maio de 1987. Essa proposta vinha sendo elaborada também por Mozart Galvão, como diretor e conselheiro da Abrasca.
5. “Minha opção é propor uma melhoria do sistema antigo, que não corrigia estoques nem atualizava os resultados pela correção do mês vigente e sim do mês anterior” – salienta o diretor da Abrasca, pedindo a oficialização da correção monetária integral, que maça realmente a inflação do país.
6. Até hoje, as companhias de capital aberto faziam a correção monetária integral apenas complementarmente, já que em seus livros era adotada a correção parcial, de acordo com a Lei 6.404 – a Lei das S.A. – explica o superintendente de Normas Contábeis da CVM. Se a decretação de novo índice ficar para julho, ele acredita que , de modo geral (de capital aberto ou não) as empresas não vão fazer a correção de acordo com a Lei das S.A., embora as companhias abertas devam corrigir as demonstrações trimestrais fora dos livros, provavelmente pelo IPC.
7. Esse índice, no entender do diretor e conselheiro da Abrasca, não tem credibilidade, abalada pelo vetor que teve em janeiro. Se o conselho da entidade aceitar sua proposta, Mozart Galvão pretende levar suas conclusões à CVM.