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Pedro A. Batista Martins[1]

A realidade não permite tergiversação: A arbitragem pegou. Por sinal, há muito tempo.

Muito embora a Lei de Arbitragem tenha sido promulgada em 1996 (Lei 9.307/96), já antes, no ano de 1995, a Lei de Concessão e Permissão de Serviços Públicos (Lei 8.987/95) marcos regulatórios importantes estabelecia o pacto compromissório como cláusula essencial nos contratos de concessão.

Por outro lado, já em seguida a vigência da Lei nº 9.307/96 e conquanto ainda pendente de julgamento no STF a questão da sua (in)constitucionalidade, o Congresso Nacional já editava legislação favorecendo a inserção da arbitragem no sistema legal brasileiro.[2]

O apreço por esse método de resolução de conflito funda-se na sua importância como fator de atração de investimentos e de empresas de renome internacional, imprescindíveis, à época, para incrementar a competição no processo de privatização.

Chancelada sua constitucionalidade, empresários e advogados perceberam a enorme utilidade desse instituto para resolver, em tempo bastante razoável, conforme determina, aliás, o disposto no art. 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal.[3] Há controvérsias não só complexas, mas cuja resposta os agentes empresariais e econômicos não poderiam aguardar indefinidamente sequer por médio ou longo prazo.

Nos tempos atuais, a dinâmica do comércio, as constantes oportunidades e a agilidade dos agentes que impulsionam negócios e transações, sejam nacionais ou internacionais, não toleram maiores delongas na resolução de impasses gerados nas mais diversas relações.

Releva, hoje, a conhecida expressão de que “tempo é dinheiro”. Face à opção entre deixar de ganhar dinheiro e perder tempo, por certo é a primeira que os empresários escolherão. E isso se dá porque dinheiro se reconquista com as oportunidades e nichos que a competição apresenta, enquanto tempo, jamais se recupera.

Exemplo prático dessa realidade contemporânea é o fato de que as empresas, com frequência, não buscam uma decisão judicial que lhe dê a segurança necessária para execução de sua atividade social, mas tão somente uma decisão liminar ou a cassação de provimento cautelar.

Frustrada uma das duas alternativas, o empresário, com a celeridade que a competição impõe, direciona seu planejamento estratégico para outro norte cuja oportunidade lhe afigure potencial.

Esse cenário impõe-se também na área desportiva, onde diversas são as relações comerciais, empresariais, marketing e etc., alavancadas por altos investimentos.

Contratos de patrocínio de atletas e clubes, direitos de transmissão, fornecimento de material esportivo, acordos de investimento, contratos de administração e investimentos em estádios, licenciamentos de uso de marcas, acordos de publicidade e propaganda e permissão para a exploração de serviço de som e imagem, são exemplos de negócios desportivos onde a arbitragem pode ser de grande utilidade, em caso de disputas resultantes dessas parcerias e relações comerciais.

Ressalte-se que a Lei nº 12.395/2011 que alterou a chamada “Lei Pele” (Lei 9.615/1998), prevê o uso da arbitragem para solucionar litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis, em mais uma demonstração de apoio à arbitragem no país.[4]

A par do apoio legislativo na introdução da arbitragem no sistema jurídico, o Poder Judiciário vem imprimindo papel relevante no fortalecimento do instituto. Suas decisões favoráveis à arbitragem conferem segurança jurídica na utilização desse meio de resolução de conflito, apoio esse fundamental para a atração de capitais e a sua inserção nas relações desportivas.

Registre-se, apenas, que as matérias referentes à disciplina e à competição esportiva somente podem ser em decididas, em caráter fina, pela Court of Abitration for Sports (“CAS”). No que toca o futebol, a FIFA proíbe as Confederações, Federações e, no particular, a CBF, de recorrer à justiça comum das decisões proferidas pela justiça desportiva nacional e pelo CAS. Essa vedação, ao meu ver, é válida independentemente do disposto no artigo 217, §§ 1º e 2º da Constituição Federal.[5]

Enfim, as especificidades formais e materiais dos contratos esportivos, o sigilo com o qual devem ser tratados para que as partes não sejam expostas a riscos desnecessários, a rapidez com que as dúvidas deles oriundas devem ser julgadas para evitar prejuízos indesejados e o caráter internacional, cada vez mais marcante, das relações desportivas, são motivos que levam à conclusão natural de que a arbitragem é um meio bastante eficiente e eficaz para preservar o máximo as partes envolvidas no litígio e seu objeto, além de garantir que seja feita justiça, em tempo hábil, a respeito de matéria bastante especializada. É preciso, no entanto, para que a arbitragem possa desempenhar em sua plenitude, o papel a ela reservado na resolução das eventuais controvérsias oriundas dos contratos desportivos, que o conhecimento específico da realidade desportiva se alie à expertise arbitral de modo a adequar seus procedimentos às necessidades do esporte.[6]

  1. Sócio de Batista Martins Advogados, Árbitro, consultor e parecerista. Autor de 4 livros e mais de 50 artigos sobre arbitragem. Coordenador e professor do Programa de Pós-graduação em arbitragem do GVlaw. Co-autor da Lei de Arbitragem.
  2. Lei do Petróleo (Lei nº 9.478/97); Lei de Telecomunicações (Lei nº 9.472/97).
  3. A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
  4. Artigo 90-C, da Lei 9.615/1998, verbis: “As partes interessadas poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis, vedada a apreciação de matéria referente à disciplina e à competição desportiva.”
  5. Cf. entendimento exposto no artigo de minha autoria “A Validade da Vinculação e Submissão Objetiva e Subjetiva à Court of Arbitration for Sports”, publicado na Revista Brasileira de Direito Desportivo, v. 10, p., 2006.
  6. “A Arbitragem e o Esporte”, Pedro A. Batista Martins e Pedro Trengouse L. de Souza, publicado no Jornal do Brasil, em 15 de agosto de 2005.