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Pedro A. Batista Martins[1]

1. Muito se costuma discutir sobre a necessidade de viabilizar o acesso à justiça. Infelizmente, contudo, muito mais poderia se fazer. O acesso ao Judiciário vem sendo negado no Brasil não apenas às classes desprivilegiadas ou de baixa renda, mas também a categorias mais abrangentes da população, como aposentados, viúvas, rendeiros e até mesmo microempresário. Se é certo que a política econômica de anos recentes contribuiu para o problema, é verdade também que a responsabilidade final tem de recair sobre o Judiciário, órgão que traz em si o poder superior de promover justiça e, assim, satisfazer o bem-estar e a harmonia sociais. A Justiça é o valor supremo da sociedade e o acesso a ela um direito social. Os obstáculos a esse acesso, no entanto, assim como a burocracia e a complexidade de sua realização transfiguraram este direito social em um assustador “problema social”. É preciso, agora, confronta-lo com perseverança e sem misoneísmo de qualquer matriz. Afinal, de que valem as normas constitucionais que asseguram direitos e garantias individuais e demais regras jurídicas de ordenação social, se o exercício de direito subjetivo pelo cidadão torna-se inacessível?

2. Se vários são os motivos que inviabilizam a realização da justiça, por outro lado é justo também afirmar que instrumentos e mecanismos vêm sendo introduzidos em nosso sistema legal de forma a minimizar algumas dificuldades. Temos, assim, como um dos instrumentos institucionais de grande valia, os Juizados de Pequenas Causas. Por sua excelente aceitação social e fácil alcance, são órgãos dos mais prestigiados pela população. É preciso apenas que haja maior atenção das autoridades em difundi-lo e estrutura-lo de forma a permitir sua maior utilização social. É necessário também flexibilizar o escopo da lei que o instituiu, para, ao menos, ampliar o valor de alçada e permitir a participação da pessoa jurídica como autora nas demandas de seu interesse. Cabe ressaltar a excelente iniciativa da Universidade Federal de Santa Catarina, que adotou um Juizado Informal de Pequenas Causas até 5 salários mínimos para atendimento da clientela carente. O Juizado atua nas causas cíveis, comerciais e de família, em processos oriundos do Escritório Modelo da Faculdade de Direito, sem custo algum para as partes e com ênfase predominante na conciliação e na arbitragem.

3. No tocante aos instrumentos processuais, louve-se o conjunto de leis recentemente promulgado (outras encontram-se, ainda, em tramitação no Congresso) que, ao buscar a desburocratização do processo civil, simplificou e agilizou o sistema judicial de solução de controvérsias. Alguns países como Canadá, Estados Unidos, França e Alemanha mostram-nos o caminho de realização da justiça, através de mecanismos alternativos de solução das controvérsias, onde a pendência é levada a efeito fora das arenas judiciais e por meio de sistema suficientemente informal. É o chamado movimento da Terceira Onda, encampado por juristas do mais alto nível, cientes do dever de contribuir para a busca de remédios legais que tornem a Justiça mais acessível. Está-se tratando de instrumentos convencionais, entre os quais se destaca a arbitragem. Como instituto milenar, a arbitragem tem por maiores virtudes a informalidade e o fato de conferir às partes envolvidas em conflito e possibilidade de estabelecer as regras do jogo e indicar, por livre vontade, quem deve decidir a matéria em questão. É a chamada “justiça dos experts”, que consagra o desejo do povo e onde quem dele se vale arca com seus custos.

4. A arbitragem é um dos caminhos para a liberdade e para a democratização na administração da justiça. Às portas do Terceiro Milênio, é preciso flexibilizar o monopólio da Justiça pelo Estado. Não há mais lugar para o paternalismo estatal nem mesmo no que se refere à resolução de pendências legais. O acúmulo de processos que abarrotam o Judiciário, as dificuldades no acesso à Justiça e a própria desmistificação do Estado obrigarão a que se adotem práticas informais no que diz respeito à administração da Justiça. É este o melhor caminho para o uso de instrumentos alternativos na solução de conflitos É preciso reavaliar nossa Justiça. A sociedade precisa, de fato e de direito, de uma Justiça comprometida com a solução dos problemas de toda a população, independente de classes sociais ou categorias profissionais. Não há mais como adiar a implementação de um sistema arbitral que se coadune com os princípios fundamentais do Estado Democrático brasileiro.

  1. Advogado, Professor e Consultor em Arbitragem.

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